quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

A NOITE DO CORVO (conto erótico)


O tempo parou diacho o domingo não anda não acaba nunca já é quase meia noite e eu aqui sem sono que preguiça que pasmaceira de plantão atendi até agora só uma febre à toa eu bem que poderia estar em casa na minha cama com a minha mulher cadê o meu livro ah aqui na mesinha vou desligar a televisão não passa mesmo nada que presta esta poltrona antiga até que é bem confortável a única coisa que presta neste hospital é melhor apagar a luz do teto e acender o abajur aahhh que bom esticar as pernas tirar os sapatos essas roupas do bloco cirúrgico são ótimas melhores que pijama cadê o cinzeiro gosto daquele grande espere antes de fumar vou tomar um pouco de leite o famoso leite da noite será mesmo que botam nitro nele deve ser conversa fiada todo hospital que tem irmã de caridade tem essa história de nitro ué que livro é esse aqui em cima da geladeira caramba A Arte da Sedução um livro francês diacho deixe-me ler a orelha epa a mais completa explanação da filosofia do amor carnal e da volúpia no sentido de um paganismo epicurista e mundano diacho é claro que isso só pode ser do Psiquiatra aquele plantonista o homem é hedonista registrado está sempre dizendo para todo mundo que é melhor ter vivido que só se vive uma vez e ele é o exemplo do que diz porque se não for mentira o que ele diz ele faz e manda os outros fazerem um faça faça faça sem fim ele aconselha a todo mundo a fazer pois não se leva nada desse mundo viva e deixe viver danado aquela vez no clube ele me viu no vestiário tomando uma ducha espiou assobiou riu e disse Deus não dá asa a cobra se tivesse a metade do meu aparelho ele iria fazer miséria quase me xingou por eu ser tímido diacho pior que tímido ser um re-pri-mido ele frisou que merda faça faça faça ou você acredita que a vida dá duas três mil safras hem pamonhão e daí se é casado aliás casado se escreve com s e não com p não é mesmo ai ai melhor deixar o livro francês dele pra lá e voltar pro meu calhamaço alemão subir a Montanha Mágica comecei meio desanimado mas que epopéia agora estou gostando o Mann é mesmo um gênio o filho da mãe me capturou como não desfrutar da leitura olha aqui o Hans Castorp o personagem central sentindo que se há inércia e cansaço do corpo o seu espírito se mantém em excitação ativa como o meu agora com uma diferença estou num plantão pra lá de monótono miseravelmente só e nada mais longe da mente que imaginar-me num mundo encantado e que poderia me envolver no sonho de um fantástico sortilégio letal bah que pasmaceira só espreguiçando mesmo nada nada vai acontecer hoje exceto um ou outro chamado sem importância o que é até bom pois plantão com urgência grave é ruim e quando tem óbito é uma merda ai que preguiça e nada de sono vamos ao livro do Mann o grande romance que se passa num sanatório suíço no alto de uma montanha diacho no início a gente imagina que é um troço enfadonho incapaz de existir coisa mais fria mais glacial bobagem o livro tem momentos bons à beça diacho de volume pesado vou esticar as pernas sobre a banqueta assim quase deitado e apoiar esta montanha de erudição e mágica sobre o estômago pronto conforto total novamente um pé descalçando o outro esses mocassins são mesmo um achado e agora um cigarrinho tenho que parar tenho que parar já estipulei não passo outro aniversário fumando essa merda mata deixe-me ajeitar a claridade do abajur quem sabe agora a leitura me entregue ao deus do sono onde foi mesmo que parei ah deixei marcado aqui quando o Mann indaga sobre a Vida deixe-me concentrar isso parece importante afinal o que é a Vida pois ninguém sabe e eu muito menos mas com certeza isso lá não é Vida estar mofando sozinho e isolado num plantão de domingo cuja noite parece ter se escondido do mundo do universo numa dobra do tempo isso realmente não é vida convenhamos dá até vontade de rir pois esse negócio de plantão cabe mais em conta num capítulo sobre a morte a decomposição a decadência ou o que valha só rindo da própria miséria aliás rir da própria infelicidade é mesmo coisa que plantonista vive fazendo sozinho que diacho deixe-me retomar as linhas olha só que interessante aqui diz que a Vida é calor é uma febre da matéria um esforço delicioso e aflitivo igual à chama da vela sensual até a volúpia que a Vida é um impudor da natureza quase lascivo um secreto e voluptuoso movimento clandestino praticamente composto apenas de sucção e exalação e envolta desta coisa túmida composta de água de albumina de sal de gorduras que se chama carne humm carne que se converte em forma em imagem sublime em beleza que se emoldura de sensualidade e de desejo que coisa diacho posso até ver essa imagem da Vida basta baixar as pálpebras fechar os olhos um pouquinho e posso ver esta imagem vaporosa assim flutuante bem diante de mim próxima dos meus sentidos meu Deus uma visita de fim de noite aqui no meu canto pois ela entrou no estar médico e se volta sorrindo para mim certa de sua graça de sua beleza o que diabos ela veio fazer aqui no estar dos médicos fecho o livro e a cumprimento assim meio sem graça encabulado com um oi tudo bem e ela ainda sorrindo me diz um olá e eu tirando os pés da banqueta pergunto você quer alguma coisa que idiota eu sou claro que ela quer alguma coisa ó meus Deus o que tenho diante de mim que corpo que corpaço aquela roupa do bloco folgada deixa ela ainda mais gostosa diacho os seios forçam com rijeza juvenil o algodão da blusa que cheiro bom ela tem exala desejo de fêmea e está me olhando que olhos bonitos oblíquos de estepe de loba que brilho estranho e misterioso sim uma loba no cio eis o que ela parece ó que opulência de ancas e nádegas este corpo é uma promessa de delícias ela como alguém do hospital já comentou é capaz de parar trânsito e de fechar um quarteirão inteiro um bairro e que boca suculenta meu Deus ela usa um batom que torna o vermelho dos seus lábios mais atraente que o carmim ai ai boca carnuda entreaberta pronta para o beijo ai que vontade morder esta fêmea talhada a ter momentos supremos de desejo e gozo o que ela quer aqui afinal alguém já me disse acho que o Psiquiatra que o marido dela é um deprimido de marca não trepa mais mas que ela é discreta não dá a mínima pra ninguém sabe que é gostosa que tem poder sobre os machos e por isso não dá a mínima eu mesmo sei disso pois ela quando a gente se cruza por acaso pelo corredor nem me olha mal cumprimenta e agora ela se encontra aqui não é nenhum truque pois ela me diz sorrindo posso me sentar um pouquinho e eu claro que sim e ela se senta ao meu lado pertinho quase grudada sinto sua coxa magnífica encostando na minha posso lhe perceber a respiração sei que ela arfa ligeiramente e que os seios que forcejam para fora da blusa assim delineados são lindos ó posso ver a pele de seus braços nus e de belo torneamento com a pele revestida de delicados torvelinhos de lanugem rudimentar ela diacho insiste em me fitar ó meu Deus todo o seu movimento de curvas femininas é aformoseado imprimindo ao corpo em todas as linhas um desejo animal ó meu pau deu um bote está duro como rocha já devo estar molhando a cueca tenho certeza diacho o coração me martela na garganta ai perturbação e medo infinitos o meu sou casado se escreve com p diacho aposto que ela percebe o meu acanhamento azar azar mesmo assim posso até imaginar a corola rubra dos seus seios um umbigo delicado redondinho e o movimento do ventre e do tórax o regaço o triângulo místico as cavidades lubrificadas as glândulas ricas em secreções todos os elementos ávidos para procriar o hálito esquentado e umedecido diacho ela também olha para o meu colo vê a ereção tremenda até sorri e sem safadeza pois neste instante seus olhos parecem envoltos em trevas misteriosas e ardem como o cigarro que busco descansando no cinzeiro para me socorrer e ela me surpreende pedindo uma tragada enfio a mão no bolso da blusa desajeitado tiro o maço sua coxa se aperta ainda mais contra a minha não quero um cigarro mas apenas dar uma tragada no seu diacho tenho o hábito de morder o filtro me desculpe está molhado ela me olha muito séria eu sei e é muito melhor assim e toma a minha mão com o cigarro levando-a até a sua boca vermelha carnuda de modo que os meus dedos pousam sobre sua face e seus lábios e ela estremece e sorve o cigarro profundamente prende e só depois solta a fumaça bem devagar e como num sonho embebido de um inenarrável espírito de desejo e de aflição escuto-a dizer quase num sussurro quero você em mim e seus olhos ficam avermelhados enquanto me perscrutam com uma intensidade sobre-humana faça faça faça vou fazer mas o que é isso o telefone interno está tocando diacho tenho que atender os chamados do plantão são sagrados só um momento alô sim sim estou indo alguém na ala A com dispnéia e dor no peito pode ser embolia no pós-operatório isso mata tenho que ver mas volto logo que puder espere aí vou rápido rapidinho num pulo que coisa eu também tenho dor no peito e dispnéia mas de desejo nada de embolia só desejo minha nossa o pau não quer baixar pronto cheguei na enfermaria mas que diabo é isso ninguém chamou tem certeza de que ninguém aqui da ala chamou o plantão está bem está bem então vou retornar para o estar médico mas que alguém chamou ah isso chamou não estou ficando doido então boa noite boa noite e já estou voltando rápido voltando rapidinho o mais que posso não quero perder o sonho pronto cheguei ei mas onde diabos ela se meteu onde está ela meu Deus não é possível que não tenha me esperado ó ó ó merda merda parece que tomei um tiro no peito deixe-me sentar ó merda será que ela voltará hem ó meu Deus ela tem que voltar ó não voltará pressinto que não voltará minha solidão me reste maldita noite infinda que barulho é esse quem está aí será ela voltando tomara tomara ó não não o que é isso meu Deus um corvo caramba na janela um maldito corvo infernal grasnando sei lá o que está dizendo hem pode repetir a potranca passou arreada e ajaezada pamonhão e você não montou não fez não fez não fez miserável não espere ela voltar ahn never o quê never o quê poderia repetir grasnando direito ó ela não voltará eu sei eu sinto agora escutei não voltará nunca mais never more
Sérgio Mudado

2 comentários:

  1. o edgar mandou dizer que gostou demais, mesmo.

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  2. já que a redi falou no edgar, preciso dizer que o allain põe. e que nós, em todas as vidas, tb gostamos do conto.

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