sábado, 25 de junho de 2011

Juca Peralta vai a São Paulo


Quer dizer então, Seo Juca Peralta, que o senhor foi indicado para prêmio? Prêmio importante. Quer saber? Mereceu! Durante alguns anos fui envolvido por intensa magia, exigida para escrevê-lo. Tintim por tintim. Capítulo por capítulo. E olha que foi um bocado de tintins e dezenas de capítulos. Fico orgulhoso ao vê-lo, azul, sozinho, de pé, sem amparos, emoldurado pelos ficus e por um céu encantado, reinado por suas amadas Marias. Direi apenas isso, nada mais. Quero que relembre das palavras da deusa, quando vocês se encontravam no trem, no Noturno do Sertão e ela lhe disse: "Serás um destino... E, nesse dia, terás perpetuado o final desse sonho que tenho sonhado para ti."
E, nesse momento, um apito de trem ouvir-se-á ao longe.

quinta-feira, 23 de junho de 2011

ÍTALO MUDADO

Wednesday, June 22, 2011

Querido Lucas,


Hoje você completa 8 meses de vida. Hoje mamãe e papai completam 9 anos de casamento. Apesar destes dois motivos maravilhosos para comemoracão, mamãe hoje tem uma (ou mais) lágrimas no coracão. Hoje o seu tio-bisavô Italo Mudado faleceu. Você não o conheceu, infelizmente. Apesar de há anos não vê-lo, estava nos planos uma visita a antiga casa do Barro Preto na nossa próxima ida ao Brasil. Difícil ainda acreditar que ele nao estará lá.


Fiquei tentando lembrar a última vez que o encontrei, entretanto, não consigo. Acredito que foi em uma de suas peças teatrais, mas não tenho certeza. Minhas lembranças do Tio Italo estão, mais do que tudo, associadas à minha infância. Lembro-me de pensar se um dia seria gente grande como ele. Por que o Tio Italo para mim, era gente grande, de verdade: alto, e com uma postura sempre elegante. Falava com autoridade e leveza. Tinha um tom ético na voz. Parecia ter uma cultura infinita. Citava peças gregas e filósofos em meio a uma conversa trivial, com fluidez e gentileza. Falava corretamente e de forma bonita; dava gosto escutá-lo conversar. Era carinhoso. Tinha uma risada engraçada. Ele me chamava de Branca de Neve desde pequena.


Obrigada, Tio Italo, por ter feito parte da minha vida. Arrependo-me de não ter aproveitado mais da sorte de ter sido sua sobrinha enquanto você estava aqui. Nao vou deixar isso acontecer de novo no nosso próximo encontro.
Renata Prado
Denver

sábado, 18 de junho de 2011

Para Pintar o Retrato de um Pássaro

Primeiro pintar uma gaiola
com a porta aberta
pintar depois
algo de lindo
algo de simples
algo de belo
algo de útil
para o pássaro
depois dependurar a tela numa árvore
num jardim
num bosque
ou numa floresta
esconder-se atrás da árvore
sem nada dizer
sem se mexer...
Às vezes o pássaro chega logo
mas pode ser também que leve muitos anos
para se decidir
Não perder a esperança
esperar
esperar se preciso durante anos
a pressa ou a lentidão da chegada do pássaro
nada tendo a ver
com o sucesso do quadro
Quando o pássaro chegar
se chegar
guardar o mais profundo silêncio
esperar que o pássaro entre na gaiola
e quando já estiver dentro
fechar lentamente a porta com o pincel
depois
apagar uma a uma todas as grades
tendo o cuidado de não tocar numa única pena do pássaro
Fazer depois o desenho da árvore
escolhendo o mais belo galho
para o pássaro
pintar também a folhagem verde e a frescura do vento
a poeira do sol
e o barulho dos insetos pelo capim no calor do verão
e depois esperar que o pássaro queira cantar
Se o pássaro não cantar
mau sinal
sinal que o quadro é ruim
mas se cantar bom sinal
sinal de que pode assiná-lo
Então você arranca delicadamente
uma das penas do pássaro
e escreve seu nome num canto do quadro.
Jacques Prévert
Para Elsa Henriquez


(Poesia de Todos os Tempos, Editora Nova Fronteira, 6ª impressão)

domingo, 5 de junho de 2011

ENCANTAMENTO

"Desse lugar não há caminho que se venha.
E, no entanto, eu a vejo ali,
junto às folhas secas do jardim,
há tanto tempo abandonado.

Mas vejo uma mulher imóvel,
como se dentro de um quarto,
sendo a moldura o canteiro,
ou meu pobre olhar amargurado.

Os pés estão quase suspensos,
e o corpo se fez de fino pólen.
Ainda posso enxergar a face,
que, apesar de tudo, me sorri.

Vinda de onde não se vem,
permanece sentada no jardim.
Tenho receio de assustá-la,
com qualquer ruído ou movimento.

Não posso, sequer, me aproximar.
Devo olhá-la de longe, cuidadoso,
sem dizer uma única só palavra,
sempre calado e sempre distante.

E penso quando irá embora,
se poderá voltar outro dia,
desse ausência de muitos anos,
e dessa vasta e lenta agonia."

O Tratador de canários, de Gilberto Nable